20071020

animação

Músicos, pintores, palhaços, caricaturistas, artesãos, pessoas-estátua e mágicos conquistaram um lugar nas ruas da cidade moderna. Esta proliferação de gente, ao ocupar os passeios e mostrar os seus dotes, contribui para o alargamento do público das artes, nomeadamente das performativas.
A cena lisboeta de animação de rua é fraca. Nas praças de outras cidades europeias é frequente ver quartetos de cordas; em Lisboa não vamos além dos acordeões. Não deixa de ser sintomático de um país onde a música clássica está pouco enraizada. Em Nova York vi meia dúzia de gajos misturar de forma incrível breakdance e basquetebol. Visitantes e residentes aplaudiam. Em Portugal, esse filão de futebolistas, nunca vi nenhum exibir-se com uma sessão de toques virtuosos perante os turistas. O protagonista mais original é aquele desafortunado cego que palma a linha verde do metro produzindo beats vertiginosos com a bengala. O homem tem talento e uma capacidade rítmica que lhe permite recriar de forma imaginativa o enfadonho "tenham a bondade de me auxiliar". Os punks passés da rua Garret que pedem dinheiro em troca de cinco notas de flauta espelham a concepção lisboeta de performance artística urbana: recompensá-la trata-se de exercer um acto de caridade e não de reconhecer a sua originalidade ou mérito. Numa perspectiva weberiana, esta seria uma atitude mais católica que protestante.
Madrid tem imensos performers. Uma banda de ciganos funde jazz e música balcânica; um homem de fisionomia russa serve-se de copos para interpretar Bach e Tchaikovsky; um anão que praticamente não tem braços, as mãos unindo-se aos ombros, transforma latas em miniaturas de motas; um sorridente negro munido de um soundsystem portátil de karaoke canta com sotaque jamaicano. E depois há os imitadores de estátuas, todos muito bem caracterizados: um Chaplin a preto e branco, uma árvore realista, uma bruxa de nariz adunco, um anjo dourado.
Trabalham quase todos os dias, alguns têm sítios fixos e outros são itinerantes, conhecem-se uns aos outros. O imitador de Chaplin termina a sua jornada quando um par de ciganos vai começar o raide às esplanadas. Cumprimentam-se, conversam um pouco e o acordeonista ensaia uma melodia. Chaplin desforra-se da imobilidade e solta uns desenvoltos passos de dança, fazendo girar a bengala prateada.

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