20070930

locutorios (sem tiles)

Um locutorio consiste num conjunto de cabines individuais donde se pode telefonar para o estrangeiro a preços baixos. Além disso sao muitas vezes centros de acesso à internet, efectuam transferências de dinheiro, desbloqueiam telemóveis, funcionam como central de anúncios imobiliários e laborais. Os clientes, bem como os proprietários, sao quase sempre imigrantes. A proveniencia dos utilizadores é relativamente homogénea: há locutorios para hispano-americanos, magrebinos, chineses, subsaharianos, indianos. É a partir de um deste último tipo que escrevo neste momento. Todos, à excepçao de mim e de um outro à minha esquerda, parecem ser oriundos do imenso país triangular. A imagem do desktop é a de uma belíssima indiana sorrindo com o Taj Mahal ao fundo.

strawberry jam

Um homem sozinho num quarto de hotel que não é turista, viajante, imigrante. Sinto um certo apelo por este tipo de personagem, a daquele que se limita a esperar algo: uma mulher difícil, um determinado acontecimento, a oportunidade de um crime. Aparecem amiúde nos livros e nos filmes, às vezes com bons resultados, outras nem por isso. Sempre tive curiosidade em saber em como me sentiria sendo um deles; como seria estar só, sem ter de correr contra o tempo que se esfuma até à hora do avião de regresso. Bem vistas as coisas, até agora nunca tinha estado num quarto de hotel sem ninguém com quem o partilhar - ainda que classificar como hotel este singelo Hostal Perez não seja talvez o mais exacto.
Os meus primeiros dias em Madrid foram intensos, desgastantes. Encontrar uma casa é difícil por estes lados, mais do que imaginava. A procura é muita e a oferta não é tanta quanto isso. Daí que os preços sejam elevados e não haja uma correspondência proporcional entre o que é disponibilizado e o que é pedido em troca. Fiz dezenas de telefonemas, mandei alguns e-mails, vi umas quantas casas. À conta disso iniciei esse processo interminável e sempre gradual que é o de interiorizar as distâncias, assimilar o espaço, entrar na dinâmica de uma cidade. Apesar de ter já estado em Madrid no ano passado e de me recordar da sua geografia, o meu olhar é agora diferente, mais dirigido aos aspectos práticos da vivência quotidiana. Depois de algumas frustrações recebo uma resposta positiva: Manuela, uma trintona que parece ser fixe com dois filhos, Leonardo e Jorge, quatro e treze anos, dá-me o seu aval: me parece muy bien que vengas. Não tinha imaginado uns companheiros de casa assim e o preço é acima do orçamento inicial. No entanto, o tamanho do quarto, a localização da casa, a sombria perspectiva de ir gastando dinheiro indefinidamente em noites no hostal e a boa impressão que Manuela e os pequenos me causam fazem-me avançar. Mudo-me amanhã para a minha nova casa, Calle de Toledo, 19, 4. izq., 28005 Madrid. Para quem conhece a cidade, é a rua que sai da Plaza Mayor para sul, na direcção da Latina. Para os outros, recorrendo a um paralelismo imperfeito com Lisboa, seria mais ou menos como estar na Rua Aúrea (ou do Ouro). Invejável, portanto.
Que faz um solitário durante a noite, quando não tem de procurar casas? No meu caso, cansado de caminhar, janto em condições, bebo umas cervejas (gosto da Mahou) ou uns copos de vinho, vejo futebol e oiço música. Ontem assisti a um concerto de um sexteto de jazz num bar porreiro chamado Populart - entradas gratuitas e bebidas caras. A aborratar por ser sexta e com gente de proveniências distintas: espanhóis residentes, italianos bonitos, um par de nórdicos de expressão sorumbática mesmo nos picos da música, americanos enormes entendidos em jazz, that's from George Benson, he'd be proud. Gosto muito do concerto e do sítio, mas não tenho carteira que aguente assim tantas idas lá. Além disso fica nas Huertas, relativamente longe da minha localização actual, em Argüelles. O sítio que eu adopto como base é café, cervejaria e restaurante ao mesmo tempo: o nome é Dublín, embora não seja irlandês. É de facto bastante espanhol, servindo-se pinchos de empanada galega e tortilha, montados de lomo e umas tapas porreiras (destaque para as anchovas e para a salada russa). Começo a dar-me bem com os empregados: Juan, espanhol carrancudo, Jorge, um rapaz simpático de aspecto índio, possivelmente peruano, e uma mulata (Conchita, acho) que além de muito bonita é bastante reivindicativa e que me parece vinda do Caribe. É no Dublín que vejo uns quantos jogos de futebol: Athletic Bilbao - Atlético Madrid, Barça - Zaragoza, Real Madrid - Betis, Barcelona - Levante. Há alguns habitués da bola e houve um com quem conversei, primeiro sobre o futebol, depois sobre o resto. Comentamos a importância de Sneijder no actual Real Madrid, a segunda época dos galácticos (eixo Makélélé-Zidane), a rotação de bola do Barça, a capacidade de antecipação de Messi, a recente crise de Deco aparentemente contariada nos últimos jogos, o dream team do início dos anos 90, Stoichkov, Romário, o campeonato que o Levante reclama ter ganho no tempo da Guerra Civil. Diz-me que por mais jogadores que apareçam nenhum será como Maradona. Que se meteu num comboio com uns amigos quando tinha vinte anos e que fez mil quilómetros para o ver jogar; nessa altura Maradona era ainda adolescente. Pergunto-lhe se é argentino, então. Confirma, chama-se Mário, mas todos lhe chamam Pajaro. Músico sem banda fixa, costuma tocar em estúdio e fazer digressões com gente conhecida, diz. Saiu da Argentina há vinte e seis anos, andou pela Europa central e do norte, pelo Kuwait antes da guerra. Toca guitarra e gosta principalmente de jazz e de música brasileira. Falo-lhe no concerto no Populart e ele diz-me que costuma tocar por lá. Convida-me para a sua próxima actuação num sítio chamado El Junco e faz-me um mapa no meu caderno. É na segunda-feira e também não se paga.

20070927

o mundo do arrendamento madrileno

Para que vejam o tipo de meio em que me tenho movido deixo-vos alguns testemunhos encontrados num site de anúncios.

Temos o que se queixa dos anúncios que pedem "sólo chicas":
TIENES RAZON, YO VIVIA CON VARIAS PERSONAS EN UN PISO COMPARTIDO, DE LAS CUALES 2 ERAN TIAS.  INCREIBLE : SE DEJABAN LOS GANCHOS DEL PELO EN EL LAVABO Y OBVIAMENTE DEJAVAN MANCHAS DE OXIDO.  UNA VEZ, LOS PUTOS GANCHOS DEBIERON ESTAR VARIOS DIAS PORQUE DEJARON ESTA MANCHA EN LA BAÑERA Y LUEGO NO SE PODIA QUITAR, SIN CONTAR LAS VECES QUE EMBOZABAN EL WC POR TENER LA BRILLANTE IDEA DE TIRAR IMAGINATE QUE.  Y LO DE LOS PELOS EN EL LAVABO, BAÑERA Y HASTA EN LA COCINA PARA QUE CONTARTE.  LO PEOR DE TODO ES, Q ALGUNAS MUJERES, POR EL MERO HECHO DE SER MUJERES, SE CREEN CON EL DERECHO DE PODER HACER LO QUE LES DA LA GANA. 

Temos o contestatário para todo o serviço:
SUPONGO QUE IGUAL QUE YO, ESTAIS HARTOS DE PATEAR MADRID PARA ENCONTRAR UNA HABITACION, Y ES QUE TODOS DEBERIAN DE TENER FOTOS, PARA NO PERDER EL TIEMPO EN VERLOS, Y QUE COBREN 300-350E POR UNA HABITACION CUTRE, QUE VAMOS A DORMIR EN UNA MINI CAMA, ESTA GENTE FLIPA.FOTOS FOTOS FOTOS, NO VENDAN LO QUE NO TIENEN.
Y EL CHICO TIENE RAZON, YO VIVO CON UNA CHICA Y UN CHICO Y ELLA ES TODAVIA MAS CERDA QUE EL, TODO LO DEJA POR AHI, TMAPOCO TIRA DE LA CADENA, MI PRIMITA DE 3 AÑOS LO RECOGE TODO.

Temos a miúda racional:
En contestación a los chicos de "sólo chicas" os diré que en parte teneis razón, no es cierto que las chicas sean hoy x hoy más limpias u ordenadas que los chicos. he de decir que yo he convivido con chicos, y si les decias las cosas las hacían sin problema, sin refunfuñar, poner malas caras,... al revés te decían "perdona me despisté" o algo así (y esto cuando se dejaban algo, q normalmente, x respeto, dejaban todo super recogido).
Pero tembién he de decir que encontrar piso en Madrid es una locura. Llevo mes y medio buscando pìso, soy chica, licenciada, trabajo para un organismo público (aunque sin nómina, con proyectos continuos, pero cobro más q si tuviese nómina), estoy haciendo el doctorado, soy limpia, ordenada, tengo buena presencia, además (a parte de xq m gusta) por mi trabajop visto bien(en plan formal), sé cocinar y m encanta, soy española, tengo 25 años y otro montón de cosas que se supone quieren en los pisos de alquiler (compartidos o no)... pues después de todo esto sigo sin encontrar piso y he buscado creeme y he ido a ver muchos pisos y he tenido que oir, sii te llamo mañana y t digo algo,... o llama dentro de un par de días a ver que tal,...
Así que seas chico o chica, cumplas los requisitos que suieren, ... encontrar piso en Madrid (pagues lo que pagues, q esa es otra) es una locura.

Temos a miúda zangada:
ME GUSTA QUE SALGA ESTA ESPECIE DE DEBATE SOBRE LAS CONDICIONES QUETE PONEN PARA ENTRAR A VIVIR EN ESA ESPECIE DE MINI CAJA DE ZAPATOS QUEALGUNA GENTE LLAMA "HABITACIÓN ACOGEDORA", O "CON ENCANTO".
YOSOY UNA CHICA DE VEINTE AÑOS Y, AUNQUE ES CIERTO QUE APARENTEMENTE PARALAS CHICAS ES MAS FÁCIL, NO ESTOY DEL TODO DE ACUERDO. YO LLEVO DOSSEMANAS BUSCANDO UNA HABITACIÓN Y NADA. HE ESTADO EN UN MONTÓN DECASTINGS HUMILLANTES, ME HAN DICHO QUE NO POR SER JOVEN, POR SERESTUDIANTE (QUE SI DE LOS CHICOS SE PIENSA QUE SON MENOS LIMPIOS ORESPONSABLES, LOS ESTUDIANTES POR LO VISTO NOS PASAMOS EL DÍA POR AHÍBORRACHOS O DROGÁNDONOS EN EL PARQUE....), POR SER CHICA E INCLUSO PORSER HETEROSEXUAL.
MADRID, EN MI OPINIÓN, ES AHORA MISMO UNAJUNGLA INMOBILIARIA, LA GENTE PULULA POR LA CALLES EN BUSCA DE TECHO YME GUSTARÍA CONOCER A ALGUIEN QUE HAYA PASADO UNO DE LOS FAMOSOSCASTINGS. ADEMÁS, LA MAYORÍA DE LAS HABITACIONES NI MERECEN LA PENA NICUESTAN LO QUE SE PIDEN. YO, SINCERAMENTE, ME SIENTO UNA GILIPOLLASDANDO VUELTAS POR LA CIUDAD VIENDO HABITACIONES DIMINUTAS POR LAS QUEAHORA YA SÍ ESTOY DISPUESTA A PAGAR VISTO LO VISTO.

Finalmente, para que não só os candidatos a inquilinos estejam representados, o proprietário indignado:
Joder, me canso de enseñar habitaciones. Edades, genero, profesion, negociar precios, pedir menos tiempo, nacionalidad, querer estar 2 en una habitacion individual, etc, etc , este verano me harte de dar paseos a curiosos. Lo unico que decis es : cuando puedo ver la habitacion? que vosotros tambien podeis poner fotos vuestras, y que te digan no es lo que busco cuando he puesto la foto o no lo puedo pagar cuando han visto el precio, pues tb jode.

madrid

Por agora pouco a registar além da extrema dificuldade em conseguir um tecto. Avenidas grandes, ecos de risos femininos, este é um sítio onde se vive bem.

20070905

tom waits

We sail tonight for Singapore, we're all as mad as hatters here
I've fallen for a tawny Moor, took off to the land of Nod
Drank with all the Chinamen, walked the sewers of Paris
I danced along a colored wind, dangled from a rope of sin
You must say goodbye to me

We sail tonight for Singapore, don't fall asleep while you're ashore
Cross your heart and hope to die when you hear the children cry
Let marrow bone and cleaver choose while making feet for children shoes
Through the alley, back from hell, when you hear that steeple bell
You must say goodbye to me

Wipe him down with gasoline 'til his arms are hard and mean
From now on boys this iron boat's your home
So heave away, boys

We sail tonight for Singapore, take your blankets from the floor
Wash your mouth out by the door, the whole town's made of iron ore
Every witness turns to steam, they all become Italian dreams
Fill your pockets up with earth, get yourself a dollar's worth
Away boys, away boys, heave away

The captain is a one-armed dwarf, he's throwing dice along the wharf
In the land of the blind the one-eyed man is king, so take this ring

We sail tonight for Singapore, we're all as mad as hatters here
I've fallen for a tawny Moor, took off to the land of Nod
Drank with all the Chinamen, walked the sewers of Paris
I drank along a colored wind, I dangled from a rope of sin
You must say goodbye to me