O Barcelona perde por um a zero e joga mal. O Getafe tem menos bola mas chega com mais perigo à área. Sou o único que segue a pouco viva partida, tirando um madrilista que exulta com a sofrível exibição do Barça. Ser do FCP em Lisboa deve ser semelhante a isto, na alegria e na tristeza - bem sei que com maior predominância da primeira.
O cozinheiro sai da sua zona de trabalho, chega-se ao balcão e aumenta o volume do relato. Para que oiças, diz-me, não pareces muito entusiasmado. Respondo que o jogo está a ser fraco mas agradeço. Pergunta-me quem joga com o desinteresse dos que não querem saber de futebol.
São nove e tal e a cervejaria está algo deserta. Pouca gente hoje, comenta, há um grupo que vem todas as sextas e ainda não os vi esta noite. Avanço com a hipótese de que, por ser feriado regional, as pessoas saem de Madrid sem que haja fluxo no sentido contrário. Ele anui com a cabeça e pergunta-me a que dias da semana se celebram os feriados de Dezembro. Não lhe sei responder. É que gostava de ir ao meu país pelo Natal, diz-me, passar lá uma semana. Pergunto-lhe de onde é - o sotaque denuncia uma origem caribenha. É de Cuba. Digo-lhe que nunca lá estive mas que sei que é uma terra bonita. Confirma, discorre sobre as praias, uma semana lá evapora-se, as horas gastas em aviões, mas enfim, não pode ficar mais tempo fora de Madrid. Aproveita para ir ao dentista, em Espanha é caro.
Família em Cuba? Pouca, responde, nem mãe nem pai. Faz oito meses que foi enterrada a tia que o criou. Pergunto-lhe se está em Madrid há muito. Oito anos, já tinha passado quinze em Estocolmo. Já lá estive , digo-lhe, também é uma boa cidade. Concorda, e acrescenta que, além disso, é mais calma, lá as pessoas sabem viver. Sentia-se seguro na Suécia, onde não há problemas em andar na rua à noite, deixar o carro aberto, esquecer-se da chave na porta de casa. Para ele, Havana e Madrid são cidades de ladrões. Há meses entraram-lhe no seu apartamento e levaram-lhe tudo, câmara de vídeo, televisão, roupa, tudo. Ainda perseguiu os assaltantes mas acabou caído no chão. O seguro não pagou nada. Hijos de puta, murmuro. Ele mantém uma expressão resignada que lhe imagino frequente: tem o aspecto desencantado dos tristes crónicos.
Na Suécia é que se está bem, resume; ainda tem uma casa no campo que tenta visitar todos os anos. Porquê sair de lá, então? Suspira e diz que é uma história comprida, queria ajudar alguém e acabou mal. O movimento aumenta na cervejaria e ele volta à cozinha.
20071111
o cozinheiro
por joão c. às 23:54
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