20071107

jorge, o mexicano

Jorge nasceu no México há trinta e dois anos. Parece mais jovem e percebe-se que lhe desagrada a perspectiva de envelhecer. Não tem antepassados mexicanos (indígenas) ou espanhóis. Os seus avós são um judeu lituano, uma polaca, um sírio e uma libanesa. Come muitos vegetais, mistura a gastronomia árabe e a mexicana. Tem uma fixação que raia o obsessivo por nórdicas e germânicas. Além de músico, partilha com um tio que vive nos Estados Unidos uma editora de livros infantis. Também tenta entrar no mundo da representação.
Os seus gostos musicais são eclécticos, dos boleros colombianos à ópera, passando por John Coltrane e David Bowie. Canta, toca guitarra e compõe. Produziu bandas sonoras para curtas metragens. Actualmente ensaia um duvidoso espectáculo de zarzuela. O tema: um faraó impotente tem à sua disposição a mais bela virgem do Egipto. Diz que não gosta do grupo e que nem sequer aprecia o estilo. A minha suspeita é que o faça pela sensação de actuar ante um grande público.
Toca sozinho em pequenos bares. Assistir a um concerto seu é presenciar uma narração expurgatória, um desfiar de memórias agridoces sobre as suas relações. Antes de cada uma das músicas Jorge explica a sua origem. Por exemplo, uma tarde passada numa ilha grega com uma austríaca. A luz incidindo na escada do apartamento de uma alemã. Um tango escrito quando se separou de uma argentina. Esta tendência para o dramatismo ilustrado cansa e resulta numa espécie de autoparódia involuntária; prefiro a mais despretensiosa exploração do folclore mexicano. Aquela que me parece a sua melhor música é inspirada numa lenda sobre uma mulata de Córdoba que enfeitiça os homens e é queimada pela Inquisição.
Tem viajado bastante. Esteve uns tempos em Los Angeles, infiltrou-se nas festas, assistiu a um concerto privado do Bruce Springsteen. Vive em Madrid há dois anos. Diz que gosta da cidade mas que não ficará aqui muito mais tempo. Tem procurado obter cidadania europeia mas sem sucesso: os papéis dos avós europeus perderam-se.

adenda: soube que, afinal, todos os avós de Jorge eram judeus. Perguntei-lhe se também se sente um. Respondeu que, ainda que não seja crente, cresceu num ambiente de valores judaicos e que alguns deles lhe dizem bastante.

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