20071119

jack london

Uma das minhas disciplinas é Utopía y antiutopía en el mundo contemporaneo. Quis ter esta cadeira assim que soube que ela existia e, embora não esteja a ser tão boa quanto supunha, vale a pena. Agrada-me estudar o cruzamento da criação literária e da proposta política. O principal objectivo é conhecer os traços gerais do género literário utópico, com destaque para as suas manifestações no século XX. Partindo de Thomas More, analisa-se Looking Backward de Edward Bellamy, Brave New World de Huxley, 1984 de Orwell.
Além destes clássicos, também se faz um percurso através de outros textos: Zamiatin, Morris, Wells, um monte de feministas e ecologistas. Cada um de nós deve apresentar um livro e a minha preferência foi para Jack London. A obra é The Iron Heel, de 1908.
Gosto de Jack London. Não está no meu Olimpo literário, até porque só lhe conheço uma pequena parte da produção, mas gosto dele. Praticou boxe, percorreu os carris da América do Norte na companhia de mendigos, foi um socialista na Califórnia do início do século XX, desbravou os mares do Sul, chegou ao Japão. Apesar de o seu centro de gravidade ser o Oceano Pacífico também dormiu nas ruas de Londres. É fácil gostar de alguém com uma vida assim, mesmo que não escreva por aí além. Jack London parece-me um bom escritor, sobretudo enquanto contador de histórias
Quanto a The Iron Heel, não sendo uma obra prima, tem o seu interesse. As personagens são, à semelhança de outras de Jack London, pouco profundas. A acção é narrada por Avis, a filha de um professor universitário que sai da candura política para se tornar revolucionária. O motivo: apaixona-se por um líder do movimento socialista, um super-herói-operário plenamente consciente da totalidade dos processos sócio-políticos que se vão desenrolando. De facto, Ernest Everhard, assim se chama ele, é tão obstinado quanto à inevitabilidade do sucesso da revolução quanto desencantado face às hipóteses de a ele assistir.
Os trusts, que constituem a oligarquia política e económica, vão reforçando de modo progressivo o seu poder. Perante uma greve geral que quer impedir uma guerra mundial, os grandes capitalistas estrangulam definitivamente o movimento operário. A oligarquia acaba por conquistar o apoio dos sindicatos mais fundamentais da época industrial, o dos trabalhadores do aço e o ferroviários, e isola-os dos restantes operários. Deste modo estes privilegiados passam a formar uma casta à parte, com salários e condições de vida muito superiores aos demais produtores. Há ainda um outro grupo que goza do benefício dos olicargas: o dos mercenários, responsável por reprimir qualquer suspeita de subversão.
Os revolucionários rapidamente formam uma sociedade clandestina. Apesar dos esforços da oligarquia, infiltram-se em toda a parte: prisões, nos hospitais, na milícia, nas fábricas. Este é um dos aspectos mais interessantes do livro, onde são descritas as estratégias, de parte a parte, para evitar a espionagem.
De resto, o texto tem duas camadas. O corpo principal é o manuscrito de Avis, em que ela descreve, primeiro, o seu encontro com Ernest e, logo, a rápida ascensão da oligarquia e a vida na clandestinidade. O clímax são os capítulos finais nos quais se descreve o falhanço de uma tentativa de revolta em Chicago que enche a cidade de sangue. Só que London aumenta a complexidade do texto ao inserir notas de rodapé assinadas por Anthony Meredith, um estudioso que comenta o diário de Avis sete séculos depois de este ter sido escrito. Isto chega a resultar cómico, como neste excerto em que é explicado de forma condescendente o que é uma greve:

These quarrels were very common in those irrational and anarchic times. Sometimes the laborers refused to work. Sometimes the capitalists refused to let the laborers work. In the violence and turbulence of such disagreements much property was destroyed and many lives lost. All this is inconceivable to us--as inconceivable as another custom of that time, namely, the habit the men of the lower classes had of breaking the furniture when they quarrelled with their wives.

É através de Meredith que sabemos que a revolução acabaria por triunfar após duzentos anos de domínio oligarca.
Ao começar este post não era meu objectivo fazer um resumo do livro. No entanto, tendo que apresentá-lo na terça-feira, acabou por servir de complemento ao estudo. Esta é a primeira cadeira de literatura que tenho, mas acho que as minhas ideias estão ordenadas.

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